O sistema renina-angiotensina (SRA) possui uma importante função na
regulação a curto e a longo prazo da pressão arterial sanguínea e no balanço
eletrolítico e de fluidos (Tigerstedt e Bergman, 1898; Peach, 1977). O potente
vasoconstritor octapeptídico angiotensina II (AII), pertencente a esse sistema,
é o principal produto da hidrólise do decapeptídio angiotensina I (produto da
ação de renina sobre o angiotensinogênio) pela enzima conversora da
angiotensina I (ECA). A AII regula uma série de respostas fisiológicas nos
sistemas cardiovascular, endócrino e neuronal, incluindo homeostase
hidromineral, produção de aldosterona e função renal (Peach e Dostal, 1990;
Catt e cols., 1993; Timmermans e cols., 1993), além de síntese de proteínas em
células do músculo liso vascular (Griendling e cols., 1994), na mitogênese e na
proliferação celular (Weber e cols., 1994).
Com base em suas características farmacológicas, várias classes de receptores de AII têm sido descritas. As subclasses mais importantes de receptores para AII que foram identificadas são: AT1, AT2 e AT4 (Chiu e cols., 1989; Whitebread e cols. 1989; Timmermans e cols., 1993; Wrigth e cols., 1995; Unger e cols., 1996). Esta caracterização é baseada na diferente seletividade de antagonistas de AII não-peptídicos em relação a estes receptores. Muitas das ações conhecidas da AII parecem ser mediadas por receptores AT1, enquanto as funções farmacológicas do receptor AT2 são menos conhecidas. A ligação da AII ao receptor AT1 estimula uma série de vias de transdução de sinal, incluindo a ativação da fosfolipase C (PLC), para gerar trisfosfato de inositol (IP3) e diacilglicerol (DAG), resultando na liberação de cálcio de estoques intracelulares e ativação de processos dependentes de proteína quinase, respectivamente (Smith e cols., 1984; Pfeilschifter, 1988; Griendling e cols., 1986). A AII também modula, via ativação de Gi ou Gs, a produção de AMP cíclico (AMPc) (Anand-Srivastava, 1983; Kubalak e Webb, 1993), ativa a cascata da proteína quinase ativada por mitógeno (MAPK), promove a fosforilação de tirosinas de proteínas citoplasmáticas (Griendling e cols., 1997; Schorb e cols., 1994) e ativa canais de Ca2+ dependentes de voltagem sensíveis a dihidropiridinas (Kojima e cols., 1985; Hescheler e cols., 1988).
A clonagem
de receptores da AII de várias espécies tornou possível o estudo extensivo das
características estruturais da interação receptor-agonista, responsável por
muitas das propriedades funcionais específicas do receptor AT1. A
análise mutacional dos receptores AT1 tem identificado muitas das
seqüências e resíduos de aminoácidos envolvidos na interação dos ligantes, na
ativação dos agonistas, no acoplamento da proteína G e na internalização do
complexo agonista-receptor (Hunyady e cols., 1994).
Através do
uso da técnica de mutagênese sítio-dirigida, resíduos de leucina (L) das
posições 262 e 265 da região transmembrana do receptor AT1 foram
permutados por um ácido aspártico (D), obtendo-se os mutantes AT1-L262D
e AT1-L265D. Após caracterização bioquímica, verificamos que somente
o mutante AT1-L265D apresentou uma marcante diminuição na afinidade
e capacidade para estimular a produção de fosfatos de inositol (Correa e cols,
2002a; Correa e cols., 2002b). Posteriormente, ao longo do doutorado,
continuamos o estudo dos mutantes AT1-L262D e AT1-L265D,
que apresentaram elevados valores basais de AMPc, correlacionados à inibição do
crescimento celular e ao aumento na formação basal de fosfatos de inositóis.
Ademais, a ação mediada pelo AMPc pareceu não ser limitada à proliferação
celular, sendo também observada transformação morfológica em células ovarianas
de hamster chinês (CHO) transfectadas com estes mutantes (Corrêa e cols.,
2005a).
Em
conformidade com as nossas observações, Singer-Lahat e cols. (1996) reportaram
que células CHO apresentaram variação fenotípica mediada por AMPc.
Concomitantemente a estes estudos, produzimos e caracterizamos novos mutantes
com substituição de resíduos extracelulares do receptor AT1, que
apresentaram ativação constitutiva e internalização independente do agonista
AII (Correa e cols., 2006), os quais não apresentaram alteração na proliferação
celular, nem mudança morfológica ou aumento basal de AMPc.
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